3 de abr. de 2012

O Caderno Velho

405900_233300486759974_100002400729187_472908_1186375351_n_large


Ela era uma menina quieta. Não tinha muitos amigos, passava a maior parte do tempo lendo, principalmente livros de ficção, como Harry Potter. Tinha uma visão diferente do que muitas pessoas tinham do mundo, achava que ele podia sim, ser um mundo repleto de pessoas boas e amigas. Possuía uma coleção de livros, que para ela eram mundos diferentes. Cada livro, um universo. Então considerava que tinha uma coleção de sonhos, sonhos que só ela podia interpretar, só ela podia viajar.


Mas uma coisa que só ela tinha era seu caderno velho. Um caderno simples que comprara quando tinha oito anos. Capa velha e dura, páginas com cheiro de mofo e uma assinatura sua na contracapa, uma assinatura mal feita, quando sua letra ainda era feia. Mas ela guardava para sempre – ou sempre, podia assim dizer – nele, ela construía seu próprio mundo, formulava suas próprias ideias. Não, não era um diário, não gostava de escrever sobre si mesma, criava personagens, escrevia sobre suas melhores qualidades e seus piores defeitos neles, criara uma imagem que queria ver em si mesma, uma imagem que ela imaginava ser perfeita se fosse usada. Anotava tudo nesse caderno. Tudo que pensava, tudo que imaginava. Para ela, esse era seu refúgio, seu modo de fugir de todas as desgraças do mundo, podia criar uma figura perfeita de mundo que só ela tinha.


Porém o tempo fora passando, e ela foi crescendo. Precisava estudar muito para fazer seu próprio mundo, sua própria vida. Cada vez mais ia aprendendo sobre a vida e as pessoas, ia tendo novas paixões, novos costumes e tivera a oportunidade de mostrar ao mundo seu talento. Pensou em mostrar a todos aqueles que amava – e todos aqueles que não conhecia também – o seu mundo imaginário. Foi escrevendo sem parar, mas dessa vez não foi em caderno algum. Ao crescer, conseguira ter seu próprio dinheiro, comprar um computador e tinha todos os seus rascunhos lá, passava horas digitando, fazendo suas histórias e fantasias. Ao terminar, pensou em tirar do confidencial, mostrou ao mundo o que tinha guardado, e o mundo gostou sim. Valorizou seu talento, e ela gostou disso. Foi mostrando mais e mais, e esses seus livros, foram vendendo cópias e cópias. Mas aos poucos ela foi percebendo que não era exatamente o que ela queria, não era o tipo de história que ela queria escrever, e sim o tipo de história que as outras pessoas queriam que escrevesse. Não queria escrever autoajuda, queria escrever suas próprias aventuras, suas próprias fantasias. Queria encantar o mundo, não importa se o mundo gostasse dela, se ela recebesse admiração, ela só queria tocar o mundo com suas histórias, não queria que o mundo a admirasse por ser somente ela, queria que o mundo a admirasse por causa de suas histórias.


Tomou uma decisão: foi ao seu quarto, abriu sua escrivaninha e pegou alguns blocos de papéis para rascunhar uma de suas histórias, uma daquelas histórias de criança que ela escrevia antigamente. Mas ao revirar todos os papéis, encontrou um caderno. Na verdade, era o caderno. Aquele velho caderno, de capa dura, um pouco surrada, páginas mofando e a assinatura que sempre esteve lá e sempre ia estar. Então foi lendo, relembrando suas inspirações, seus momentos. Lágrimas caíram, aquilo fazia parte de sua vida, não eram apenas palavras quaisquer. Como pudera deixar tudo tão escondido? Mas entendera, de fato aquilo era como um tesouro. Tesouros são muito preciosos e ficam escondidos por muito tempo. Só são descobertos – ou nesse caso, lembrados – quando você realmente precisa. Então “desenterrou” seu tesouro e usou-o. Realmente foi uma boa escolha. Ela viu que o mundo reagira com o seu fascinante talento. Vendeu muitas cópias, não tantas como antes, mas muitas suficientes para fazê-la sorrir. Descobriu que o que realmente lhe fazia feliz não era a quantidade e sim o efeito que causava nas pessoas. Não escrevia somente para adultos, queria tocar as crianças também, para que se possível elas se tornassem uma pessoa cheia de sonhos e de tesouros para enterrar. Descobriu o quando aquele caderno velho sempre esteve presente em sua vida.

0 comentários:

Postar um comentário

Só comente quando saber pelo menos 10% do post e escolha a opção "Nome/URL". Ah e não aceito selos/tags e nem parceria. Obrigada pela visita.